Nepotismo: o veneno que trava a democracia

OPINIÃO
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Nilza Dacal

O nepotismo actua como um veneno silencioso que corrói os alicerces da governação democrática, transformando o bem público em património privado e bloqueando o progresso. Ao priorizar laços familiares em detrimento do mérito, especialmente em países africanos, onde a democracia luta para se consolidar, esta prática não só alimenta a corrupção e a ineficiência, como também mina a confiança dos cidadãos nas instituições. Consequentemente, o favoritismo em cargos políticos sacrifica a competência, aprofunda as desigualdades e condena nações inteiras à estagnação, tratando sobrenomes como credenciais e deixando o mérito à margem.

O nepotismo compromete a economia, a coesão social e a credibilidade institucional, minando a democracia. Em Angola, por exemplo, a nomeação de um familiar para liderar a empresa estatal Sonangol resultou em acusações de corrupção e má gestão, desperdiçando recursos em um país onde mais de 50% da população vive na pobreza, segundo o Banco Mundial, evidenciando o custo da ineficiência governamental. No Malawi, a confiança pública, que é tida como um pilar da democracia, foi devastada quando um familiar do presidente foi nomeado para um cargo diplomático, apesar de promessas de anti-nepotismo, gerando indignação popular, fortalecendo opositores e abalando a estabilidade política. Em nações culturalmente diversas como a Nigéria, o favoritismo por aliados regionais intensificou tensões étnicas, ameaçando a unidade nacional. O nepotismo também expulsa talentos, como no Zimbabwe, onde nomeações familiares contribuíram para a emigração de milhões, segundo a ONU, em busca de oportunidades negadas. Na República Democrática do Congo, a nomeação de um familiar para uma entidade estatal afastou investimentos, fragilizando uma instituição vital para o desenvolvimento.

E quando os partidos políticos são reféns do nepotismo?

Quando partidos políticos, que deveriam ser motores de progresso e representatividade, tornam-se reféns do nepotismo ao priorizar laços familiares sobre o mérito, enfrentam graves consequências que comprometem a sua legitimidade, coesão interna, capacidade de liderança e administração, impactando directamente a democracia. O nepotismo corrói a confiança pública, pois os eleitores percebem o partido como um instrumento de interesses familiares, não do bem comum, especialmente quando nomeações de parentes para cargos de destaque contradizem promessas de meritocracia, gerando indignação, desilusão e fortalecendo opositores, o que enfraquece a base de apoio e a capacidade de mobilizar a população para reformas. O favoritismo familiar cria ressentimentos entre membros qualificados preteridos, alimentando rivalidades e facções que desviam a energia do partido de prioridades colectivas para disputas internas, comprometendo a formulação de políticas coesas e perpetuando instabilidade dentro da organização. Nomear familiares sem qualificação para cargos estratégicos resulta em má administração, seja em órgãos públicos ou na estrutura partidária, prejudicando a entrega de serviços essenciais como saúde e infra-estrutura, o que erode a confiança dos cidadãos no partido como gestor do bem público e mina sua autoridade moral. O nepotismo também distancia o partido da sua base eleitoral, especialmente em contextos de desigualdade, pois ao priorizar elites familiares, é visto como alheio às necessidades da população, reduzindo o engajamento eleitoral e levando eleitores desiludidos a se afastarem ou apoiarem alternativas políticas. Além disso, o nepotismo bloqueia a renovação de lideranças, marginalizando jovens talentosos e perpetuando uma elite política envelhecida e desconectada das demandas sociais, o que impede inovações para enfrentar desafios como desemprego e desigualdade, condenando o partido à obsolescência em um cenário político dinâmico. Em resumo, o nepotismo transforma partidos em feudos familiares, alimentando desconfiança, instabilidade e ineficiência. Para recuperar a sua legitimidade e cumprir seu papel de impulsionar o progresso, os partidos devem priorizar o mérito, abrir espaço para novas lideranças e reconquistar a confiança popular, fortalecendo assim a democracia.

Possíveis soluções

Para combater o nepotismo e fortalecer a democracia, é essencial adoptar medidas práticas e transparentes. Criar leis claras para proibir o nepotismo, com punições como multas, destituição de cargos e inelegibilidade aplicadas por tribunais independentes. Nomeações públicas precisam seguir processos abertos, com critérios objectivos baseados em qualificação, usando plataformas digitais para divulgar vagas e evitar conflitos de interesse, reforçando a confiança pública. Campanhas educativas nas escolas, universidades e comunidades, apoiadas por mídias e sociedade civil, devem promover o mérito e desmistificar a ideia de que laços familiares garantem competência. Canais seguros e anónimos para denúncias, protegidos contra retaliações, com investigações rápidas e públicas, que empoderam os cidadãos a combaterem o favoritismo. Fiscalizações regulares por órgãos independentes, com relatórios públicos, devem monitorar nomeações em órgãos. Aumentar a capacitação dos gestores em matérias de ética e governança para líderes, pois são cruciais para priorizar o bem comum. O engajamento de ONGs, sindicatos e jornalistas na fiscalização de nomeações torna o nepotismo insustentável. Essas acções integradas garantem que cargos públicos sejam ocupados pelos mais qualificados.

O nepotismo não é um mal menor, é o roubo deliberado do nosso futuro e traição da própria promessa democrática. Cada nomeação baseada em laços de sangue é um prego no caixão da meritocracia e um insulto à inteligência de um povo. Não podemos mais ser espectadores passivos, enquanto este veneno paralisa as instituições e condena gerações inteiras à mediocridade. A luta por uma governação justa e transparente, onde a competência supera o parentesco, não é mera opção politica, é um dever cívico inadiável. A hora de exigir que o mérito, e não o sobrenome, seja a única chave para o poder é agora. O nosso silêncio é cumplicidade, e o futuro não perdoará a nossa omissão.

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