Mulheres em posições de tomada de decisão ignoram interesses do género

SAÚDE SOCIEDADE
  • Influência política das mulheres ‘longe’ de ser alcançada
  • Lealdade aos partidos acaba comprometendo afirmação da sua agenda

Há cada vez mais mulheres a participarem cívica e politicamente nos processos de tomada de decisão. O país ocupa o 19° lugar no mundo em termos de representação feminina no parlamento, o que corresponde a 42,2%. Todavia, em termos efectivos, os direitos e a influência política das mulheres nos processos de tomada de decisão no país estão longe de serem alcançados.

Neila Sitoe

Embora haja cada vez mais mulheres na política e em círculos de tomada de decisão, a luta pela sua auto-afirmação e de suas agendas ainda está longe de ser vencida. Muitas vezes, as mulheres em posição de liderança ou em círculo de tomada de decisão não têm tido espaço para impor agendas e interesses comuns das mulheres, pois acabam sendo obrigadas a defender os interesses de partidos políticos.

Agnaldo Oficiano, sociólogo, destaca que para que as mulheres possam participar activamente nos círculos de tomada de decisão precisam ter consciência do que é participar, pois o que não acontece com muitas delas é que acabam defendendo interesses próprios e dos partidos a que representam, mas de forma inconsciente.

“Não basta as mulheres estarem representadas por números. É imperativo que as mulheres nas posições de decisão estejam motivadas e tenham conhecimentos adequados para promover os interesses dos diferentes grupos de mulheres e da sociedade em geral”, afirmou.

Por seu turno, Agostinho Bento, gestor de advocacia e empoderamento juvenil na Actionaid Moçambique, defende que a consciência cidadã não está muito presente nas mulheres e raparigas, porque falta-lhes o conhecimento sobre os seus direitos e deveres e sobre seu papel como agentes de mudança no seu contexto social e político.

“É preciso aumentar a representação das mulheres na tomada de decisões de forma consciente, desde o nível local, os comités de gestão de recursos naturais, conselhos consultivos, assembleias municipais até o nível nacional”, destacou.

Bento acrescentou que a limitada participação das mulheres tem como causas os factores históricos, tradicionais e culturais. Quando analisada com base nos instrumentos legais como a Constituição da República de Moçambique e demais leis existentes no país, não há nenhuma reclamação a ser feita, mas não é o que espelha a realidade.

“As mulheres que participam nos espaços de tomada de decisão, actualmente, estão fortemente leais ao partido no poder, que tem dominado muito a esfera política, social e económica desde a independência de Moçambique. A forte demanda de lealdade para com o partido determina todas as decisões políticas e económicas tomadas”, sublinha. 

Foi para reverter este cenário que as organizações da sociedade civil que militam em prol dos direitos humanos, igualdade e equidade de género e outras acções, como é o caso da Actionaid Moçambique, vem desde 2012 realizando formações cujo objectivo é empoderar as mulheres que vivem em situações de extrema pobreza, algumas com acesso à educação e outras não, das zonas rurais e urbanas com conhecimento para que possam participar dos espaços de tomada de decisão, com vista a reivindicarem os seus direitos.

“Sempre militarei em prol dos direitos humanos”

Mirna Chitsungo, jornalista e activista social, é uma jovem que se destaca na luta contra as desigualdades. Inconformada com várias situações que via as mulheres a serem sujeitadas, decidiu singrar na luta em prol do bem-estar da mulher e da sociedade em geral.

“Comecei a me interessar pelos assuntos políticos desde o tempo em que estava a me formar em jornalismo e um tempo depois trabalhei no Fórum Nacional das Rádios Comunitárias, onde difundia informação de interesse das comunidades sobre direitos humanos, participação política, processos eleitorais, entre outras temáticas. Quando chegasse o tempo das eleições, sejam autárquicas ou gerais, eu entrava em contacto com as rádios comunitárias para que enviassem as evidências dos resultados e assim pudesse produzir o comunicado de imprensa”, relata.

Chitsungo diz que sempre militará em prol dos direitos humanos, e como não se pode militar em prol dos direitos humanos sem mexer com a política também lutará pela democracia.

“Actualmente, exerço a função de consultora de comunicação na Actionaid, no programa de governação que tem por objectivo fazer com que os cidadãos participem dos processos de diálogos de tomada de decisão, mas com destaque para a participação feminina, e faço parte do Observatório das Mulheres (mecanismo de defesa dos direitos humanos das mulheres) de forma individual, como activista, e também de forma profissional, como Actionaid, mas sempre militarei pelos direitos humanos”, relata seu percurso.

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