- Preso injustamente e abandonado desde a morte de Daviz Simango
- Lutero Simango chega a perseguir quem se aproxima de Navalha
- “O Provedor da Justiça mostrou que não é nada sem o sistema”
- “Desde a independência, quem pensa contrário é morto, preso ou perseguido”
Supostamente vítima de perseguição política numa das províncias mais inóspitas para membros de partidos da oposição e da sociedade civil, Agnaldo Navalha, preso dias antes das Eleições Autárquicas de 2018, nas quais era cabeça de lista do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) ao nível do município de Xai-Xai, província de Gaza, vive momentos bastante penosos na Penitenciária de Máxima Segurança da Machava, sobejamente conhecida por BO, onde se encontra encarcerados após ser condenado numa decisão bastante controversa ao ignorar provas que supostamente confirmam a sua inocência pelos crimes que é imputado. Desde então, a família tem se desdobrado em esforços para tentar demover várias instâncias de justiça, mas debalde. E como se tal não bastasse, a mãe queixa-se de total abandono do seu filho pelo MDM, sobretudo desde a morte de Daviz Simango.
Duarte Sitoe
Em Março de 2018, mesmo com a ausência de provas e falta de alegações do Ministério Público, o Tribunal Judicial de Xai-Xai, na altura dirigido pelo juiz Alfredo Matusse, irmão de Renato Matusse, posteriormente afastado por suposto envolvimento em corrupção, condenou Agnaldo Navalha a 12 anos de prisão por fogo posto, danos em animais e furto qualificado.
Volvidos quatro anos e sete meses após a leitura da sentença, Navalha encontra-se encarcerado na BO, e apesar dos recursos e petições enviados ao Tribunal Supremo, Tribunal Superior de Recurso, Provedor da Justiça e ao Ministério Público, o processo com contornos obscuros e requintes de intolerância política, numa província que é praticamente proibido ser membro da oposição ou da sociedade civil, continua estagnado.
Navalha foi preso num aparente expediente político, meses antes das eleições autárquicas de 2018, quando preparava-se para concorrer como cabeça de lista do MDM na cidade de Xai-Xai. Foi acusado de fogo posto, na sequência de uma manifestação popular ocorrida no dia 04 de Fevereiro do mesmo ano, no Distrito de Limpopo, em que um grupo de moradores locais ateou fogo a uma residência que se suspeitava ser esconderijo de sequestradores que se dedicavam ao tráfico de órgãos humanos.
A sociedade civil não tem dúvidas de que se trata de um preso político. O Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD) disse, numa análise publicada este ano, que o arguido não participou da manifestação que culminou com destruição de propriedades privadas arroladas na acusação e que o Tribunal Superior de Recurso “ignorou” o recurso interposto pela defesa. Aliás, chega a referir que o “único crime de Agnaldo Rui Navalha é ser membro do MDM”.
Navalha foi sacrificado por ser membro do MDM, partido do qual hoje se sente abandonado, segundo revelou a mãe, Ana Paula Tui em conversa com o Evidências. Aliás, a fonte aponta que desde a morte de Daviz Simango o partido nunca mais deu assistência a família Navalha.
“O actual presidente do partido até anda a perseguir a todos que dão a cara para abraçar a causa da liberação do Navalha. Os colegas e membros do partido, até alguns deputados, dão sua assistência e acompanhamento, mas o presidente do partido não”, desabafa.
Apesar do aparente abandono, Ana Paula Tui refere que o seu filho não está magoado com o partido e que o mesmo sonha em ver o MDM a ser um exemplo de governação em Moçambique.
“Em conversas que temos com ele, não sente mágoas do partido, mas sente que cada dia que passa se desviou dos motivos que nortearam a criação do MDM. Já não é o partido que antes queria ser o espelho para o povo e que foi e é exemplo de governação. Então não tem mágoa, mas pena porque não é este o projecto que meu filho abraçou. Hoje se o partido não consegue visitar meu filho, imagine os que tem pais falecidos tem assistência?”, acrescentou.
PGR e Provedor da Justiça ignoram extinção de crimes no novo CP
Recentemente, a Associação Rede dos Direitos Humanos enviou um requerimento à Procuradoria – Geral da República solicitando a anulação da sentença que determinou a sua prisão, mas, debalde, a instituição chefiada por Beatriz Buchili preferiu assobiar para o lado.
Na tentativa de repor a legalidade na prisão de Agnaldo Navalha, Ana Paula Tui tentou bater a porta do Provedor da Justiça, Isac Chande, que era ministro da Justiça na altura dos factos, mas sem sucesso.
“Tive um encontro com o provedor no seu gabine, onde pedia-lhe intervenção junto ao Tribunal Superior de Recurso para a celeridade e discutir a questão da extinção dos crimes, mas ao invés de responder meu pedido apenas limitou-se em dizer que devo informar ou sensibilizar o meu filho a ter bom comportamento para beneficiar da liberdade condicional. Não é isto que eu ia tratar com ele”, lembra.
A mãe de Navalha aponta nas entrelinhas que a luz do novo Código Penal aprovado em 2019 estes crimes fogo posto, furto qualificado e danos não previstos especialmente já não existem, tendo desabafado que o Provedor de Justiça preocupa-se em resolver assuntos de terrenos e barracas.
“O provedor passa a vida a chorar mas nada faz. Este apenas resolve assuntos de barracas e terrenos de singulares. Agora, senhor jornalista, acha que o provedor pode resolver os problemas de Milhulamente em Marracuene ou os problemas do mercado do peixe onde os terrenos foram entregues aos graúdos? Não! Então o Navalha é político e ameaçador, por isso ninguém quer pegar o processo dele”, destaca.
Justiça recusa-se a juntar provas
Na opinião de Tui, a ausência do Ministério Público no dia do julgamento e das alegações finais mostra claramente que Agnaldo Navalha foi vítima de uma perseguição política.
Para além da estranha ausência do promotor da acção penal no dia do julgamento, Ana Paula T ui aponta outras irregularidades que marcaram o processo, dentre as quais a recusa do juiz em ajuntar algumas provas, dentre as quais uma entrevista que Navalha concedeu à TVM no dia do crime, o que prova que não esteve no local do crime, para além de que o relatório dos bombeiros.
Pedimos para estes requerer a TVM para dar uma entrevista que meu filho concedeu neste dia do crime. A não descrição do corpo delito do bem furtado, e a existência do relatório dos bombeiros para aferir a existência com perícia do fogo posto, mas a PGR pegou papel e caneta sem levar o processo ao colectivo dos magistrados também arquivou e disse concordar mas que devia sim se recorrer ao Tribunal Supremo. Então a administração da justiça está num PingPong com este processo”, denuncia.
Jurando de pés juntos a inocência de seu filho, Ana Paula Tui exige a despartidarização do aparelho de administração de justiça e dá como exemplo da promiscuidade que compromete a imparcialidade do judiciário o facto da ministra da Justiça, Helena Kida ser membro do Comité Central do Partido Frelimo.
“Os moçambicanos devem rapidamente exigir despartidarização deste órgão, isenção e imparcialidade. Como o meu filho não seria condenado com magistrados políticos que passam a vida a discutir os assuntos políticos? O meu filho foi julgado pelo juiz que foi expulso já da classe por corrupção, mas também é irmão do Renato Matusse membro sénior da FRELIMO envolvido nas dívidas ocultas. Já imagina, não tinha saída. A todo custo este devia ser condenado por querer ser candidato à presidência do Município de Xai-Xai. Estavam a cortar as pernas do cabeça de lista as autarquias do membro do MDM”, desabafou.
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