Um Governo sem nenhum imaculado e nenhuma estrela

DESTAQUE POLÍTICA
  • Uma orquestra desafinada chamada Governo
  • A um ano e meio do fim do mandato, nenhum Ministério se destaca pela positiva
  • Os 5 ministros mais brilhantes do primeiro mandato andam perdidos em combate
  • Núcleo duro de Nyusi já não convence e os problemas vão desde a TSU à falsas promessas

 

O Presidente da República, Filipe Nyusi, anunciou, semana passada, a convocação das eleições gerais (presidenciais, legislativas e provinciais) para o dia 9 de outubro de 2024, prenunciando, assim, o fim de um ciclo de governação, num momento de uma incomum impopularidade do actual Executivo que, diferentemente do primeiro mandato, em que pelo menos quatro ou cinco ministros brilhavam e suportavam a máquina, actualmente, apresenta-se como uma orquestra desafinada em toda sua dimensão e não se assaca sequer um ministro cujo trabalho é vistoso e digno de registo. Até um reformista e pragmático bastante elogiado quando esteve na Eletricidade de Moçambique, Mateus Magala, bastou se juntar ao Executivo para se tornar um campeão de promessas não cumpridas. Da “equipa dos sonhos”, nomeadamente Max Tonela, Carlos Mesquita e Celso Correia, que compunha o núcleo duro de Nyusi no primeiro mandato, nenhum ministro se destaca pela positiva, estando envolvidos em intermináveis escândalos de incumprimento de promessas feitas, fazendo com que projectos promissores, desde o Sustenta, Cabotagem Marítima à TSU, sejam autênticos falhanços.

 

 

Depois de um primeiro mandato, em que o seu Governo foi testado ao extremo, durante quase todos os cinco anos devido a sequência de factores adversos, com destaque para a crise económica, agravada pela descoberta das dívidas ocultas e a suspensão do apoio externo ao Orçamento do Estado; calamidades naturais que desabrigaram milhares de pessoas e deixaram muitos em insegurança alimentar, instabilidade político-militar, entre outros, Filipe Nyusi tomou posse para um segundo mandato no dia 15 de Janeiro de 2020, relançando expectativas sobre a possibilidade de levar o país a bom-porto.

 

Com um orçamento deficitário e dificuldades de acesso aos mercados, Celso Correia, Osvaldo Machatine, Max Tonela e Carlos Mesquita faziam parte do grupo selecto das grandes estrelas de Nyusi no Governo anterior, mas era o primeiro que fazia a orquestra funcionar. Celso Correia, que chegou a ter o título de Super-ministro, era o arquitecto e o “pagador” de alguns projectos e iniciativas de grande sucesso no primeiro mandato, que permitiram projectar, em algum momento, uma boa imagem do Governo e de Filipe Nyusi, em particular.

 

Como que a coroar a equipa que ganha, Nyusi reconduziu o seu núcleo duro para o segundo mandato, e neste momento, tirando João Osvaldo Machatine – que acabou sendo afastado após sucessivos escândalos – os “três mosquiteiros” que faziam a orquestra soar, mesmo quando os demais não davam litro, parecem estar perdidos em combate ou num barco totalmente a deriva.

 

Num Governo visivelmente sem ideias, a acusar cansaço e cujo único recurso que sobra são episódios regulares de demonstração de arrogância, rareiam estrelas com brilho para sustentar a máquina governamental.

O Super-ministro e outras estrelas apagadas

Nalgum momento, no presente ciclo de governação prestes a findar, era impossível falar do actual Governo sem fazer menção a Celso Correia, que brilhou, primeiro, com a pasta do Ambiente e Desenvolvimento Rural e agora está a ter um desempenho mediano na pasta da Agricultura e Desenvolvimento Rural, onde, através do projecto SUSTENTA, tentou transformar a agricultura familiar em uma cadeia de valor comercial, no entanto, os resultados estão ainda longe da expectativa criada.

 

Celso Correia continua a oscilar entre períodos apagados e algum momento de visibilidade, mas está longe de lembrar o super-ministro que até provia soluções para outros ministérios e para o Governo no geral, ou seja, deixou de ser o combustível para a locomotiva funcionar.

 

Quem também anda apagado é Carlos Mesquita, outro ministro da constelação do mandato passado, que no início do mandato assumiu a pasta de Indústria e Comércio, mas mais tarde foi movimentado para as Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos.

 

Se no pelouro dos transportes o fracasso da propalada Cabotagem Marítima por ele içada como uma das principais conquistas já o assombra, no sector da Indústria e Comércio, Mesquita não conseguiu elevar o nível de diálogo público-privado.

 

Enquanto isso, nas obras públicas herdou os problemas deixados pelo seu antecessor e até hoje não conseguiu justificar a confiança para o sector. A Estrada Nacional Número Um continua sendo uma dor de cabeça e os empresários em Sofala chegaram a sugerir ao Governo a remoção do asfalto para permitir melhor transitabilidade.

 

Para além de ter falhado o prometido arranque das obras de reabilitação da EN1 este ano, o ministro anunciou intervenções localizadas com contratações nebulosas, mas não abrangeu os troços mais críticos. Neste momento, a ligação entre o Sul, Centro e Norte está condicionada.

 

Mas, os pecados do apagado Mesquita não param por aí. O modelo utilizador pagador que foi apregoado como solução para a manutenção de estradas não só não mostrou até aqui nenhum resultado, como também a qualidade das obras feitas pela REVIMO, cuja primeira pedra foi por si lançada, deixa muito a desejar.

 

TSU afunda reputação de Tonela

 

Hoje, falar ou mesmo defender Max Tonela no meio de um grupo de funcionários públicos é arriscar-se a ser apedrejado ou insultado. É, hoje, a personificação da frustração dos funcionários públicos. As inconsistências da Tabela Salarial Única, os problemas de enquadramento, os atrasos e irregularidades da data de vencimento, a oscilação do valor do salário, entre outros, fizeram despencar a reputação de um ministro que ainda preservava.

 

Chegou ao cargo para substituir Adriano Maleiane, com o objectivo de desbloquear alguns projectos nebulosos que o seu antecessor se recusava a dar OK. Até conseguiu, nalgum momento, satisfazer alguns ministros que tinham projectos congelados, mas não conseguiu liderar o processo de reforma salarial, o que levou a uma crise sem precedentes na função pública.

 

Nos últimos dois anos, que coincidem com o seu consulado naquela pasta, as escolas e hospitais estão sem orçamento, a ponto de ficarem sem material básico e por vezes ficarem privados de energia eléctrica, para além de outros problemas que fazem com que não consiga ser sequer a sombra do que já foi no passado.

 

Enquanto isso, Adriano Maleiane, que saiu da pasta de ministro da Economia e Finanças para assumir o cargo de primeiro-ministro, tirou todo o peso de contas deficitárias das costas e conseguiu passar à margem das trapalhadas da TSU, pese embora o projecto tenha sido iniciado no seu tempo.

 

Especialista em bater e fugir, Maleiane continua a mentir em boa parte das suas intervenções públicas, o que faz com que seja pouco credível entre os membros do governo, sobretudo quando o assunto são as perguntas ao Governo na Assembleia da República.

 

Armindo Tiago virou arrogante e insensível e Namashulua “está a mais” na educação

 

Depois de deixar boas impressões nas suas primeiras aparições como ministro da Saúde, mostrando uma boa capacidade de mobilização dos recursos humanos durante a Pandemia, está hoje irreconhecível.

 

De humilde e tecnicista que conseguia comover a tudo e todos, tornou-se um tanto quanto arrogante e insensível aos olhos da classe médica, que cumpre mais de um mês de greve e não encontra amparo e nem sinais de compreensão de Armindo Tiago, que parece ter sido capturado pela política. Suas últimas aparições têm sido para mandar recados, sobretudo aos médicos.

 

Com o programa “Um Distrito, Um Hospital” a ser empurrado pela barriga e falta de meios e medicamentos que levam o sector a estar a beira do colapso, Tiago carrega no seu currículo uma série de promessas e mentirinhas não cumpridas, como quando prometeu introduzir TACs em todos os hospitais provinciais.

 

Por sua vez, Carmelita Rita Namashulua, ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, está sempre presente nos holofotes pelas piores razões. Tem tido uma prestação algo apagada e não consegue prover soluções e ideias claras para colocar a máquina a funcionar. Esteve no centro do furacão aquando do escândalo nos livros escolares e agora por causa da falta de capacidade de gerir a questão das horas extras que levaram muitos professores a abandonarem turmas do curso nocturno por falta de pagamento desde o ano passado.

 

Arsénia Massingue é outro caso que oscila entre o bem e o mal. Consegue mostrar algumas reformas notáveis no sector, mas não consegue mostrar punho para resolver a questão dos raptos que assombram o sector.

 

Daniel Nivagara, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, consegue ser mais apagado que a própria sombra. Não lhe são conhecidos grandes feitos, senão a célebre promessa de computadores a todos os estudantes do ensino superior que nunca chegou a acontecer.

Outra grande nulidade é a ministra da Cultura e Turismo, que continua a navegar em águas turbulentas e sem grande protagonismo. Nem a cultura, nem o turismo tem hoje uma marca palpável da sua passagem por estes dois sectores.

 

Igual apreciação pode se fazer em relação a Nyeleti Mondlane, cuja existência como ministra só é recordada nos dias que dirige cerimónias públicas. A protecção social registou um grande revés nos últimos anos.

 

Nem grandes promessas, nem polémicas

 

Verónica Macamo Ndlhovo, ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, cuja nomeação foi alvo de desconfiança do público, tem usado da sua maturidade para manter-se longe das polémicas e liderar os negócios e cooperação do país.

 

Tem coordenado com uma certa maturidade a pasta, e mesmo no momento mais nevrálgico da geopolítica mundial conseguiu manter Moçambique amigo de todos, e como corolário desta política, o país foi eleito por unanimidade no Conselho de Segurança da ONU. O seu grande TPC é conseguir dar uma boa resposta ao problema de vandalização de bens de moçambicanos na fronteira com a África do Sul.

 

Alheia a polémicas e com aparições mais discretas e maduras, Margarida anda longe dos escândalos que sempre rodearam a instituição durante o mandato das suas duas antecessoras. Com um sector pouco sensível, tem se mostrado forte na dinamização do diálogo com os trabalhadores dentro e fora do país e o sector. Através do INSS, tem conseguido estar sempre a inaugurar e a fazer obras, e por duas vezes teve que intervir para frear tentativas de subfacturação no processo de contratação de bens e serviços no INSS, o que lhe valeu alguns elogios pela coragem.

 

Já Cristóvão Chume continua a passar também longe da polémica, tirando o seu romance com uma ministra, e tem conseguido mostrar liderança no sector. Comunicativo e bem articulado, consegue desembaraçar sempre que possível o que parece embrulhado. Os ganhos no terreno são notórios.

 

Helena Kida é outra ministra que parece estar a fazer as pazes com os moçambicanos, depois de ter confundido os My Loves com mototaxis. Mostrou ponderação na gestão da crise da Igreja Velha Apostólica e no seu consulado o ministério abriu os cordões à bolsa para construir imponentes Tribunais Distritais.

 

A Ivete Maibase, ministra da Terra e Ambiente, também não é dada a polémicas. Está sempre presente nos festejos de datas comemorativas e nos lançamentos de campanhas. É notável o seu engajamento e conhecimento do sector. Para além da transformação e requalificação de parques e Reservas, o seu mandato leva o condão de ter conseguido repovoar algumas espécies que estavam ameaçadas de extinção, ao mesmo tempo que se regita uma redução considerável dos níveis de caça furtiva.

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