Quantos milhões de dólares vai nos custar evitar embaraçar a testemunha Filipe Nyusi

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  • Em acordo secreto, PGR deixa cair parte do processo em Londres e PrivInvest prescinde de Nyusi

Depois do acordo entre o Estado moçambicano e a UBS, que adquiriu títulos do Credit Suisse, na semana passada houve novos desenvolvimentos no caso das dívidas ocultas em Londres, com o Grupo PrivInvest a voltar a arrastar o Presidente Nyusi à brasa, ao conseguir autorização para recorrer da decisão que dava imunidade ao Chefe de Estado moçambicano. Entretanto, num acordo cujos termos continuam secretos, os advogados que representam Moçambique em Londres, cujo início está reprogramado para 16 de Outubro corrente, decidiram retirar algumas acusações que pesavam sobre a PrivInvest e o seu dono Iskandar Safa, alegadamente para “evitar embaraçar testemunhas”, e coincidentemente, no mesmo dia, aquele grupo libanês decidiu prescindir do testemunho de Filipe Nyusi, embora mantenha o recurso sobre a imunidade de Filipe Nyusi, ou seja, o Estado pode ter preferido entrar em acordos para garantir tão somente a protecção de um único cidadão, chamado Filipe Nyusi, arriscando-se a comprometer o interesse nacional. Não se sabe qual é o valor envolvido neste acordo, mas acredita-se que Moçambique terá prescindido de boa parte do valor global da indemnização que exigia do grupo PrivInvest.

A Procuradoria-Geral da República (PGR), através do escritório de advogados Peter & Daves, pode ter hipotecado os supremos interesses de toda uma nação, num acordo ainda secreto com o grupo PrivInvest, que visa, essencialmente, evitar o embaraço da eventualidade de Filipe Nyusi ser chamado a depor em Londres.

Até a sexta-feira da semana antepassada Filipe Nyusi estava protegido em Londres por uma imunidade, por ser Presidente da República de Moçambique, após decisão do juiz do caso das dívidas ocultas em Londres, Robin Knowles. Contudo, o Tribunal de Recurso de Inglaterra e País de Gales admitiu um recurso da PrivInvest em relação à imunidade concedida, abrindo uma nova incerteza sobre a eventual ida de Filipe Nyusi ao tribunal para responder sobre o seu propalado envolvimento no escândalo.

Este episódio terá, certamente, servido de um impulso para negociações extrajudiciais entre Moçambique e o Grupo PrivInvest, culminando com a retirada de boa parte da acusação movida pelo Estado moçambicano contra o conglomerado naval e o seu dono Iskandar Safa.

Horas depois dos advogados de Moçambique desistirem de uma parte substancial da queixa contra a PrivInvest e seu dono, o Grupo PrivInvest anunciou que também decidiu abrir mão do testemunho de Filipe Nyusi, que até aqui reputava como sendo essencial para o esclarecimento dos subornos, o que levanta a suspeita de a PGR ter cedido finalmente à “chantagem” de quem sempre declarou ter provas de que pagou subornos a aquele que é agora o mais alto magistrado da nação.

Pelo menos é isso que se assaca nas palavras do advogado de Moçambique, Jonathan Adkin, que disse, na passada quinta-feira (05.10), ao Tribunal Supremo de Londres, que o país desistiu de processar a PrivInvest e o seu proprietário, Iskandar Safa, para evitar “perdas económicas”, por acreditar que a PrivInvest pode não ter capacidade de pagamento caso seja considerado responsável.

Mas o advogado da PrivInvest, Duncan Matthews, disse ao tribunal que Moçambique abandonou o processo por estar “sem esperança” de ganhar e porque levaria a um interrogatório “profundamente embaraçoso” às testemunhas, dentre as quais Filipe Nyusi, caso a imunidade fosse levantada pelo Tribunal de Recurso, e outras personalidades Moçambicanas.

Em outras palavras, Moçambique preferiu desistir de tentar recuperar cerca de 830 milhões de dólares de alegadas perdas económicas sofridas entre 2016 e 2018, referentes à dívida da EMATUM, pura e simplesmente para proteger Filipe Nyusi, que havia entrado novamente na berlinda, após a admissão do recurso.

“Concluímos que não vamos envolver o Presidente Nyusi” – PrivInvest

Numa decisão anunciada curiosamente no mesmo dia (quinta-feira 05.10), o grupo naval PrivInvest confirmou que não vai mais chamar o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, como testemunha no julgamento sobre o caso das dívidas ocultas de Moçambique no Tribunal Comercial de Londres.

“Concluímos que não vamos envolver o Presidente Nyusi”, afirmou Duncan Matthews,  advogado da PrivInvest, abrindo espaço para um julgamento em que Moçambique, em termos práticos, já só persegue migalhas, após deixar cair acusações substanciais contra a PrivInvest e seu dono.

O julgamento completamente com novos termos e acusações mais brandas inicia em 16 de Outubro, e tal como Filipe Nyusi, outras figuras proeminentes moçambicanas já não irão testemunhar.

Quantos milhões vai custar o acordo para Nyusi não ir ao Tribunal?

Os termos do acordo entre a PGR e a PrivInvest ainda não são públicos, mas acredita-se que Moçambique terá prescindido de boa parte do valor global da indemnização que exigia do grupo PrivInvest para evitar embaraçar testemunhas de topo do nosso país.

Não se sabe ao certo quanto dinheiro está em jogo neste acordo, mas pode custar boa parte dos 10 mil milhões de dólares que Moçambique pedia em indemnização da empresa PrivInvest, pelos danos causados na contratação das dívidas com garantia do Estado a favor da ProIndicus, EMATUM e MAM.

Moçambique pedia ainda às autoridades britânicas que declarassem nulas as garantias dadas para a concessão dos referidos empréstimos, mas ao prescindir do testemunho de Iskandar Safa e desistindo de parte da acusação, não há clareza se ainda há elementos fortes o suficiente para dar cobertura à exigência de anulação das garantias.

Refira-se que Filipe Nyusi sempre foi o grande trunfo da defesa do Grupo PrivInvest, que desde o início solicitou que fosse chamado ao tribunal, sob alegação de que o Presidente moçambicano esteve directamente envolvido no caso das dívidas que o país quer ver anuladas pela justiça britânica. Segundo o grupo libanês, Nyusi reuniu-se diretamente com representantes da PrivInvest, esteve diretamente envolvido (quando era ministro da Defesa) na preparação dos projectos em causa e solicitou à PrivInvest contribuições para a campanha eleitoral dele e da FRELIMO.

Embora o seu nome tenha sido referenciado por réus e declarantes desde o primeiro ao último dia, o juiz do caso, Efigénio Baptista, que vezes sem conta chegou a mostrar algum nervosismo sempre que o nome do PR era citado, recusou-se a notificar Filipe Nyusi, alegando imunidade e falta de fórum.

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