Frelimo foi a primeira vítima: O ensaio da fraude foi feito no último Congresso

EDITORIAL

É ainda sobre a fraude eleitoral que gravita, não apenas o debate, mas também a vida social e política do país, e agora belisca a economia, ao comprometer o comércio nas principais capitais provinciais do país, e a nível internacional já surgem alarmes que ameaçam fechar a torneira de alguns financiamentos externos, como é o caso do Millennium Challenge Corporation (MCC), mas também algum apoio programático ao Orçamento do Estado.

 

No entanto, o entourage de Nyusi, a quem vários organismos internacionais rotulam de autocrata, não mostra sinais de remorso e consolida seu controlo das instituições do Estado (Justiça, CNE, STAE e polícia) para manter os resultados do dia 11 de Outubro, os maiores responsáveis pela tendência de instabilidade que o país caminha.

 

A campanha da normalização dos vícios que subverteram a verdade eleitoral com narrativas de que as eleições em Moçambique sempre foram fraudulentas, ignorando a “alta dosagem” da fraude deste ano, está a encontrar na própria Frelimo uma resistência histórica que ameaça a continuidade do grupo, cuja sobrevivência deve ser definida em menos de um ano.

 

Por outro, a persistência da Frelimo formal, de que o resultado é merecido, colocando o partido cada vez mais distante da sociedade, hasteia a mesma prepotência que marca o exercício deste consulado, ilustrando já de forma estrutural a causa dos erros da gestão do Governo. A nível de gestão, ficou claro que tanto a Frelimo, assim como o país sofrem da mesma (des)governação e é preciso olhar para algumas similaridades que são esclarecedoras para identificação do problema e dos responsáveis da insatisfação colectiva, e talvez assim será fácil aceitar que vale a pena toda luta para repor a verdade eleitoral.

 

O primeiro estágio da ascensão para autocratismo foi fecho dos espaços de debate e da crítica dentro da Frelimo, posição que viria a ser consolidada no último Congresso, onde se arregimentaram as escolhas dos chefes a dedo com números coreanos, ou seja, 100% dos votos. Naquele Congresso institucionalizou-se internamente a fraude e a compra de votos como recursos de preferência para assaltar o Comité Central e criar uma Frelimo ávida em romper com figuras tidas como reserva moral do partido naquilo que os mais ousados chamam de “disrupção”. O discurso para o efeito era de que é a vez dos jovens, que são a maioria. Um discurso que deve, entenderam, ser acompanhado de acções que confirmam que são capazes de revitalizar o partido, danem-se os meios.

 

E consequentemente, porque é preciso uma forte base de apoio e presença para reinar, a fraude verificou-se na eleição dos órgãos sociais como OJM, nas conferências provinciais e ganhou a expressão máxima no último Congresso. Quem não se lembra que chegou a se comentar que até a distribuição de votos para membros da CP foi a dedo para dar para uns uma maior legitimidade (?). Este período foi antecedido de um movimento de silenciamento e bloqueio da crítica. Ainda continua bem fresca na memória de todos, a tentativa de assassinato de caracter de Tomas Salomão, Samora Machel Jr., Graça Machel, Castigo Langa, quando ousaram criticar a direcção do partido.

 

E todo este imbróglio que encontrou no partido o espaço de ensaio foi replicada e implementada à escala nacional. E a ideia de que quem critica não é bem-vinda (é contra o desenvolvimento) conduziu o país a erros de gestão que colocaram o país em retrocesso contínuo. A insurgência que vinha se alastrando com a recusa de intervenção internacional, depois da recusa de distribuição equitativa de oportunidades, o colapso de administração pública depois de várias critica a Tabela Salarial Única, o Sustenta, a reforma na educação, saúde, transporte, ou seja, houve fracasso tanto dos grandes projectos que deviam ser marco deste consulado, até na gestão de rotina… e para sobreviver recorreu a mesma estratégia de sobrevivência interna, a fraude. A diferença é que desta vez a dosagem foi tão alta que nem a própria Frelimo se identifica.

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