O governo de Daniel Chapo

OPINIÃO

Alexandre Chiure

O novo governo, formado, apresentado publicamente e investido há quase um mês, para o primeiro grupo de ministros, e há cerca de uma semana, para a segunda leva de nomeações, incluindo de secretários de estado provinciais, está na boca dos moçambicanos.

Há quem diga que o governo que o Presidente Daniel Chapo nos apresenta é maioritariamente do sul. Outros entendem que algumas escolhas foram para pagar alguns favores. É uma opinião a respeitar. Outros ainda defendem que este governo não é de inclusão como prometera o PR. Aí concordo. Não vejo, na sua composição, quadros com reconhecida capacidade técnica, pertencentes à sociedade civil.

A título de exemplo, a nomeação do juiz-conselheiro do Conselho Constitucional para o cargo de ministro da Justiça não caiu bem. Numa situação em que as eleições de 9 de Outubro são tidas como fraudulentas e o CC é acusado de ter passado ao lado da justiça eleitoral, a indicação deste homem para o governo foi mal visto perante o público ao ser encarado como um agradecimento.

No fundo, o que está em debate é se as escolhas de Daniel Chapo são acertadas ou não, tendo em conta os desafios que se colocam, sendo que este governo é visto por alguns críticos como da segunda linha.

Se é uma equipa B ou não, não importa, pois mesmo com a segunda linha pode-se ganhar um jogo. O que interessa é que vá atrás dos problemas que levam os moçambicanos a estarem nas ruas a protestar, nomeadamente: o custo de vida, a falta de emprego, a habitação e oportunidades para jovens, uma educação e saúde de qualidade, o que passa por elaborar políticas públicas que atendam as preocupações dos cidadãos.

A luta pela justiça eleitoral foi apenas um pretexto. O motivo maior das manifestações é a saturação. As pessoas estão cansadas de tanto sofrer e querem mudanças, uma boa qualidade de vida. O actual regime não terá o período de graça. A impaciência é grande. As pessoas querem resultados imediatos.

Há ministros que têm mais desafios do que os outros, como é o caso do Interior a quem cabe a responsabilidade de, em primeiro lugar, resgatar a imagem da polícia perante o público. Devido ao mau comportamento por parte de alguns agentes, disparando e matando cidadãos indefesos em manifestações, houve uma ruptura no relacionamento polícia-povo que urge recuperar.

Ficou provado que não temos polícia treinada e equipada para lidar com as manifestações. Agentes que sabem ser e estar em situações destas. Uma polícia republicana que não toma partido de questões políticas. Que trabalha lado a lado com o povo e não hostilizando pessoas. Ser polícia é perigoso. Pode ser morto por populares como vingança contra o assassinato de seus entes queridos.

Por incrível que pareça, hoje em dia ninguém respeita a polícia. Esta perdeu autoridade sobre o cidadão, o que é muito grave. Os cidadãos deixaram de ter medo de arma e, mesmo, de morrer. Quando se chega a esse nível é muito perigoso.

Em nenhuma parte do mundo repelam-se manifestantes com AKM como acontece em Moçambique, mas, sim, através de instrumentos apropriados como jacto de água, balas de borracha e outras formas não letais. Se não existem, compram.

O que é certo é que a polícia não deve continuar impune ao matar pessoas nas ruas que mais não fazem se não exercer o seu direito de se manifestar escrito na Constituição da República. Em todo o mundo há manifestações, mas raramente morrem pessoas. Nós já perdemos mais de 300 cidadãos vítimas de balas disparadas pela polícia.

Por seu turno, o Ministério da Agricultura tem que encontrar uma estratégia que permita que o país produza comida abundantemente, sendo que temos água, mão-de-obra barata e 36 milhões de hectares aráveis. Estamos em condições de produzir tudo o que queremos para a nossa alimentação, incluindo arroz, trigo e outros produtos.

Não se justifica morrermos à fome e termos de depender de importações quando o país tem muitas potencialidades agrícolas. Se outros países, como a África do Sul, produzem e até exportam parte da sua produção, porque é que nós não podemos fazer o mesmo? Vamos trabalhar.

O novo ministro do pelouro está numa situação privilegiada. Não precisa de mandar desenhar novas estratégias. É só abrir as gavetas. Vai encontrar tantas, algumas das quais interessantes, produzidas por diferentes ministros que passaram daquela casa e que, infelizmente, não foram implementadas.

Quando, num hectare, tiramos três a cinco toneladas e no mesmo espaço, os chineses produzem 10 ou mais toneladas, significa que alguma coisa está a falhar entre nós.

O ministro da Educação, outro sector problemático, tem que resolver o problema de distribuição do livro escolar. Garantir que seja produzido em Moçambique e que chegue às escolas atempadamente.

O sector tem, igualmente, o desafio de tirar as crianças do chão e acabar com turmas a funcionar debaixo das árvores. É vergonhoso para um país com 50 anos da independência.

Em 30 a 40 anos, alguns países tornaram-se desenvolvidos, como é o caso de Singapura, Japão e outros e nós continuamos a debater-nos com necessidades básicas. Triste. Não faz sentido, por exemplo, que haja falta de carteiras quando uma das riquezas que o país tem é a madeira. Vamos trabalhar.

O governo, no seu todo, tem que trazer de volta a estabilidade política que reinava no país, o que passa pelo diálogo entre este e o Venâncio Mondlane, a cara do movimento reivindicativo, para o fim da crise política pós-eleitoral em Moçambique.

Não se pode falar de investimentos com um ambiente de incerteza que se vive no território nacional. Não há como mobilizar investidores a desenvolverem projectos e oferecerem postos de empregos aos moçambicanos enquanto circularem, pelo mundo, imagens a reportarem cenas de violência nas ruas. Neste momento, o país está parado. Ninguém está a investir por culpa da arrogância por parte dos políticos. Vamos trabalhar.

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