Não é só uma questão moral, há problemas de legalidade na importação do Rolls Royce

EDITORIAL

Estão a brincar com a nossa inteligência, com direito a lavandarias de imagem. Estão a ridicularizar a indignação pública, a negar-nos o direito de questionar e a tentar confundir-nos.

O afortunado empresário Salimo Abdula importou, em Dezembro, uma viatura Rolls Royce que, apesar de ter custado 25 milhões de meticais, pagou apenas 1559 meticais ao Estado. Sim, somente uns míseros 1559, beneficiando-se de uma estranha isenção de pagamento de direitos aduaneiros na totalidade, no mesmo Estado em que importar um dubaizinho chega a custar os olhos da cara ao pacato cidadão, que por vezes chega a pagar aproximadamente 100% do valor da compra em direitos e demais imposições aduaneiras.

Sem a intervenção bondosa do Estado, o empresário devia ter pago cerca de 12 milhões aos cofres do Estado. A postura do Governo, que tem apertado o cerco quando se trata dos mais fracos, criou uma onda de indignação no seio dos moçambicanos que apontam que, afinal, existem filhos e enteados na “pátria amada”.

Tirando as trapalhadas dos que tentam insanamente limpar a imagem do empresário, não se sabe a troco de quê, o que vemos é o resultado claro e cristalino que Salimo Abdula foi o beneficiário de uma isenção com contornos promíscuos e de máxima expressão de um Estado forte para com os fracos e brando para com os fortes.

Documentos vazados com objectivo claro de distanciar o Rolls Royce de Florindo Nyusi que as redes sociais o associavam a viatura, apontam que a isenção é usufruto do direito e regalia do deputado concedido em 2015. O documento tenta informar aos moçambicanos que, de 1994 a esta parte, Salimo Abdula, dono de uma frota invejável de brinquedos de luxo que ele e seus filhos fazem passear na cidade, não importou qualquer viatura e guardou o seu direito e regalia de isenção de importar uma única viatura por mais de duas décadas, para, chegados 28 anos depois, colocar a sua luxuosa Rolls Royce nas estradas de Maputo. Tudo bem, é mesmo um homem de visão!

Mas, porque quem mente se perde, os mensageiros dos bons ofícios de lavagem de imagem perdem-se em argumentos e chegam, eles próprios, a se confundir ao sugerirem que a viatura importada com uma “imaculada” isenção de deputado de primeira legislatura, no século passado, antes da era 2000, concretamente entre 1994-1999, afinal, é para ser usada na qualidade de Cônsul da Malásia, com matrícula amarela e tudo. Uma cartola bem tirada num País de incautos, não é!?

Trata-se de uma mentirinha prontamente desmentida pela Autoridade Tributária que, através de um despacho exarado pelo director geral das Alfândegas, Taurai Tsama, tentou explicar os contornos da promiscuidade, adiantando que se tratou da obediência ao pedido da Assembleia da República que argumenta, na sua declaração, que esta foi atribuída no âmbito de usufruto de direito e regalia como deputado.

Um outro facto que concorre para indiciar uma relação promíscua entre o Estado e Salimo Abdula é o facto do primeiro ter dado 100% de isenções a uma viatura cujas características ultrapassam o tecto definido no Estatuto, Segurança e Previdência do Deputado aprovado pela nr 31/2014, de 30 de Dezembro. É que a lei só permite a aquisição duma viatura até 4500 cc3. No caso do Rolls Royce estamos diante de uma cilindrada bastante superior. Em média, uma Rolls Royce tem motor V12 e com 6592 cc3. Nos casos em que a cilindrada é maior, o Estado não atribui a isenção a 100% por cento, o que não foi o caso do sortudo do Salimo Abdula.

Claramente, estamos perante um problema moral, de um Governo que vai se superando em escândalos que expõem a promiscuidade entre o Executivo e os empresários que vivem nas tetas do Estado. Mais do que isso, estamos perante um atropelo a Lei, o que significa que não é apenas um problema de Estado, mas do próprio Salimo Abdula, que se aproveitou da sua relação promíscua com o Estado para fazer vista grossa a legislação. Este é o cumprimento em pleno da receita para empobrecer um país e asfixiar os fracos.

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