Manuel Chang: uma bomba atómica em véspera de eleições gerais

DESTAQUE POLÍTICA
  • Ex-governante já começou a falar e também acusa Filipe Nyusi
  • Filipe Nyusi é já oficialmente citado em três tribunais (Maputo, Londres e Nova York)
  • Telefone de Chang poderá trazer novas informações com potencial de abalar a elite política

O antigo ministro das Finanças de Moçambique, Manuel Chang, começa a ser ouvido em sede de discussão e julgamento a partir do dia 29 de Julho, no mesmo tribunal de Brooklyn, Nova York, que julgou Jean Boustani. Estima-se que a audição poderá durar cerca de um mês, dependendo da colaboração ou não do réu, e a sentença poderá ser conhecida entre Setembro e Outubro, em pleno período eleitoral em Moçambique, o que poderá soar como uma Bomba Atómica para a elite política ligada ao partido no poder, em particular para o seu Presidente Filipe Nyusi, que já foi citado no processo.

De acordo com o Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique, que tem seguido o caso de perto, o juiz do caso decidiu marcar para 29 de Julho o arranque do julgamento do antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, depois de uma audiência preliminar no passado dia 25 de Março.

Ademais, o juiz do caso, Nicholas G. Garaufis, decidiu que o Governo pode fazer buscas no telemóvel de Chang, que foi confiscado pelas autoridades sul-africanas em 2018, averbando a primeira grande derrota à defesa do antigo governante nos Estados Unidos.

O arranque do julgamento do antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, em vésperas das eleições gerais está a gerar algum nervosismo no seio da elite ligada ao partido Frelimo, com receio de que finalmente poderá ser aberta a caixa preta do caso das dívidas ocultas, trazendo revelações comprometedoras, tanto para o partido como para a sua liderança.

O receio justifica-se pelo facto de o julgamento poder durar mais de um mês, como aconteceu no caso de Jean Boustani, que arrancou a 15 de Outubro de 2019 e terminou um mês depois, a 22 de Novembro do mesmo ano.

Tendo em conta a similaridade do processo, acredita-se que a audição de Manuel Chang poderá durar mais ou menos o mesmo tempo, podendo, parte significativa do julgamento, coincidir com o período de campanha eleitoral, o que poderá ser uma verdadeira bomba atómica.

É que a campanha eleitoral inicia a 23 de Agosto, três semanas depois da data prevista para o arranque do julgamento em Nova York. Quer isto dizer que, se durar mais de um mês, a parte final do julgamento vai ocorrer em simultâneo com a campanha.

Dependendo do tipo de revelações que virem a surgir dos depoimentos de Chang, dos e-mails descodificados e declarações de departamentos federais dos EUA como o FBI, pode acentuar ainda mais o nível de popularidade e credibilidade da Frelimo.

O CIP revela que uma nova acusação contra Manuel Chang acaba de ser deduzida pelo governo norte-americano, através do Departamento de Justiça (DOJ). O documento de 24 páginas é designado Acusação de Substituição (Superseding Indictment) e não inclui outros réus do caso.

Segundo revelou o CIP, Manuel Chang nega todas as acusações e aponta o Presidente da República, Filipe Nyusi, como o principal responsável pela contratação das dívidas ocultas.

Por sua vez, o Governo dos EUA defende que o projecto do Sistema Integrado de Monitoria e Protecção (SIMP) do espaço marítimo moçambicano, que deu origem às dívidas ocultas, não foi pensado pelo Governo moçambicano nem concebido para proteger o espaço marítimo de Moçambique. A acusação diz que é um projecto de “fachada criado pelos réus e co-conspiradores para ganhar dinheiro”.

O antigo ministro é apontado como tendo feito parte do esquema que defraudou investidores norte-americanos e “serviu-se do sistema financeiro norte-americano para ganhar dinheiro de subornos e comissões e ainda fez a lavagem do dinheiro do crime praticado, usando, igualmente, o sistema financeiro dos EUA”.

Embora até aqui Chang não se tenha declarado culpado para se beneficiar de um acordo, tudo está em aberto até lá. No ordenamento jurídico dos Estados Unidos da América existe o que chamam de “plea bargain” (justiça penal negociada), ou seja, um acordo de redução de pena, bastando para tal colaborar com a justiça, entregando detalhes sobre o envolvimento de outros elementos de uma certa organização criminosa.

Preso em trânsito, em Dezembro de 2018, pela Interpol no Aeroporto Internacional Oliver Tambo, em cumprimento de um mandado de prisão emitido pelo governo dos Estados Unidos da América, quando estava prestes a embarcar de férias para o Dubai, onde consta que iria inaugurar um empreendimento imobiliário particular, tem agora chance de se defender em tribunal e revelar detalhes sobre a sua participação no calote.

Com este acordo, Chang poderá dar mais detalhes que podem conduzir a outros envolvidos e seu grau de participação no calote, como, de resto, aconteceu em 2019, no julgamento de Jean Boustani, que de Nova York arrastou uma série de figuras políticas nacionais para a lama e apresentou provas de pagamentos feitos, incluindo a um indivíduo denominado New Man, que se acredita que seja Filipe Nyusi, cujo nome tem sido frequentemente relacionado ao calote nos julgamentos, em Maputo, Nova York e Londres.

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