O diálogo é o único meio possível para reposição da paz e estabilidade ameaçadas pela crise pós-eleitoral. Aliás, a manifestação é um instrumento de pressão que conflui no diálogo, onde é formalizado o discurso das ruas que nasce das aspirações colectivas, que se tornaram agora num movimento de “salve Moçambique”. Pelo que o diálogo é parte incontornável deste longo caminho para a paz e estabilidade. Isso dá mérito a iniciativa Presidencial que, embora tardia, expõe uma solução prática e abandono das estratégias meio ortodoxas que degradam e banalizam as instituições do Estado, como os processos parciais da PGR, a repressão da polícia que chegou ao banalismo de lançar gás lacrimogénio às residências e a decisão inconstitucional de restringir liberdades através de corte de Internet, como táctica de persuadir os manifestante, ignorando o facto de ser a comunicação um direito básico, incluindo daqueles que são indiferentes a esta luta.
Todavia, isto não invalida a aparente boa intenção de ter no diálogo o espaço onde devem ser resolvidas as questões da crise eleitoral que evoluíram para colocar em causa todas as políticas públicas dos governos da Frelimo, talvez esta foi a estratégia que acabou por aglutinar as massas de todas as faixas etárias que, mesmo indiferentes as desavenças políticas, com um discurso que transcende partidos, acabaram se identificando e forçando eclosão de marchas de todos os sectores ou comunidades que antes não se manifestavam por receio de intimidações.
Mesmo com este avanço de confirmação de todos os convidados, não é possível credibilizar a sábia decisão de ver no diálogo ultrapassadas as diferenças enquanto as instituições do Estado, que se espera imparcialidade, são arrastadas para defender a hegemonia da Frelimo. É que há aqui todos os indicadores de que estamos diante de um diálogo minado, enquanto não são desarmadas (apartidarizar) as instituições do Estado e seja restaurada a confiança para que nenhum dos interlocutores avance para o diálogo com o sentimento de ameaça. Deve estar claro, antes de mais nada, que independentemente dos resultados do diálogo, nenhuma parte estará sob ameaça.
É preciso restaurar a confiança, tanto para os indivíduos envolvidos quanto às instituições. Estamos na crise actual porque as nossas instituições não são sérias. A postura em curso do Conselho Constitucional, de consultar à lupa todo o processo eleitoral, é efeito da pressão que está sofrer e não de sua integridade, é consequência das manifestações, é resultado dessa incitação para que paute pela integridade. A postura da PGR de abrir um processo contra Venâncio Mondlane, ignorando os excessos da polícia que causaram danos fatais, incluindo morte das crianças, é reflexo dessa parcialidade, que resulta, em consequência, de toda desconfiança nos órgãos do Estado. Pedir 32 milhões ao Venâncio Mondlane e não abrir qualquer processo contra quem, de forma deliberada, em obediência às ordens superiores, matou consolida a velha percepção sobre Moçambique: um Estado de um grupinho. Afinal, nenhuma justiça séria se “rende a dois pesos e duas medidas”. Ou o Ministério Público entra para julgar com imparcialidade ou ignora, sobe o risco de minar os esforços feitos a nível político.
A consequência dessa combinação de forças, uma pressão judicial vs diálogo nível político, é de ter interlocutores que avançam para diálogo descrentes, na defensiva e que vão à mesa das conversações para desfilar seus holofotes, afinal a consciência de um território minado não permite um diálogo franco, honesto e nem justo. Não cabe numa cabeça de sanidade mediana que a Presidência da República, que é também um órgão do Estado, dê um tratamento de excelência a um indivíduo que é tratado pela PGR como inimigo do Estado. É muita incoerência. Precisamos restaurar a confiança e desarmar o terreno para o diálogo.
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