Artistas denunciam 50 Anos de “abandono” e falta de interesse em promover a cultura

CULTURA DESTAQUE
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“A cultura nunca foi prioridade neste país (…) Sempre foi deixada para trás”

No mês em que Moçambique celebra meio século de independência, vozes sonantes da música nacional, como Mingas, Assa Matusse e Tabasily, denunciam o abandono da cultura pelo Governo moçambicano. Os artistas falam de um País onde a produção artística continua a depender do esforço pessoal e da boa vontade das casas de pasto, em vez de políticas públicas. De entre vários desafios, apontam a falta de financiamento, a inexistência de editoras e o desinteresse do governo, sobretudo do Ministério da Educação e Cultura em promover os artistas e as mais variadas manifestações artísticas.

Elisio Nuvunga

O dia 25 de Junho é sinónimo de festa para os moçambicanos, uma vez que foi nesta data que, em 1975, Samora Machel proclamou a independência nacional no Estádio da Machava. No entanto, para os artistas o momento foi de um balanço negativo e as reclamações vêm de artistas tanto da velha, como da nova geração.

Para a diva da música moçambicana, Mingas, a cultura sempre foi deixada para trás e nunca foi tratada de forma prioritária comparativamente com os outros sectores.

“Havia tanta prioridade, que a cultura como sempre foi vista como a última. Como não é importante para o desenvolvimento de um país”, afirma Mingas, que teve de aprender a produzir os próprios espectáculos, desde a emissão dos bilhetes até à contratação dos músicos e aluguer de equipamentos.

“Faço tudo até hoje. É um trabalho pesado”, lamenta a cantora, destacando que, para além do esforço criativo, o artista nacional tem de se transformar em gestor, produtor, e, por vezes, até num “pedinte”: “Temos que ir pedir patrocínio. E chamam-nos de nomes”, lamentou.

A talentosa jovem Assa Matusse, voz da nova geração, converge com a visão da veterana Mingas, lamentando que nem com o passar do tempo nada tenha mudado.

“Tudo o que a Mingas falou parece estar ainda a bater com o que está a acontecer hoje”, comentou Assa que também produz os seus próprios concertos com parcerias pontuais de centros culturais, o último dos quais teve lugar ainda este mês com grande aceitação do público.

Para Assa Matusse, a diferença entre o presente e o passado está na percepção da importância cultural.

“Retrocedemos um bocadinho. Na altura do presidente Samora Machel havia sensibilidade. Hoje, o Governo aposta em tudo menos naquilo que temos de mais forte. É por isso que Moçambique continua fora do mapa cultural do mundo. O País precisa de mudar. Isso é possível desde que haja vontade”, acrescentou ao seu mar de lamentações.

Identidade apagada, cultura esquecida

Assa sublinha o papel da música e da arte na projecção da identidade nacional, mas lamenta o facto de não haver uma política do Governo para a protecção das obras e regulação da concorrência, sobretudo com conteúdo estrangeiro.

“O público escuta o que vem de fora porque é o que é permitido. Noutros países, como a África do Sul, os cidadãos valorizam a sua própria música e o mundo também os reconhece por isso. Enquanto noutros quadrantes a arte fala por si, aqui, infelizmente, temos de explicar de onde somos quando estamos noutros países”, afirma Matusse.

Tabasily, um dos nomes marcantes da marrabenta contemporânea, é ainda mais contundente, destacando como sendo 50 anos de “recuos”, com o país parado e um Governo que “não investe nos seus artistas, nem na própria cultura”.

Para o músico, Moçambique é o único País da região austral sem uma única editora musical, o que, para ele, revela o grau de desinteresse político.

“Quando somos convidados para fora, nem somos valorizados. Os artistas muitas das vezes são convidados para representar o seu talento lá fora, mas acabam por não ir porque não têm apoio de ninguém. Ninguém valoriza o artista de casa, mas o estrangeiro é bem recebido e bem pago”.

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