Intolerância política em tempos de transição: Até que ponto Chapo tem palavra activa?

EDITORIAL

A escassos dias da campanha eleitoral, que já se inicia próxima semana, já se fazem ecoar as tradicionais perseguições próprias da nossa democracia que se nega a um jogo eleitoral limpo, consciente e despido de manchas de intolerância nessa pequena diversidade política, que nos é característico aqui no índico.

 

Apesar de estarmos diante de novos actores na corrida, como são os casos de Daniel Chapo e Venâncio Mondlane, a destacarem-se cada um com uma aparente singularidade na forma de se projectar, os recentes indicadores de intolerância política (perseguição e vitimização), remetem-nos às velhas queixas, o que sugere, a princípio, que a relevância dos candidatos por mais rica que seja, é reduzida pelo sistema, preso no tempo em que recebia voto pela sua relevância histórica ou a troco de capulana.

 

O alegado atentado contra a vida de Venâncio Mondlane, em Inhambane, por suposto agressor que estava na plateia curiosamente com uma máscara de proteção respiratória e um boné, como quem visava esconder a cara, pode ser o indicador da velha intolerância política e expõe ignorância total em relação ao perfil do novo eleitor, que além de apostar nos manifestos, é sensível às vítimas (ou supostas) do poder político dominante.

 

No ano passado, episódios similares aconteceram com Paulo Vahanle, em Nampula, e Manuel de Araújo, em Quelimane. Na ocasião, a PRM justificou tratar-se de agentes à paisana que visavam proteger aqueles dirigentes ou candidatos da Renamo. Se o objectivo é proteger, porque o assegurado não é previamente informado e tem que ser surpreendido com pessoas armadas próximos a si e ainda por cima mascarados? A PGR tem que investigar bem este fenómeno antes que isto resulte numa tragédia.

 

Na mesma semana, apareceu a Renamo a acusar a Frelimo, em Manica, de impedir os seus membros de se alojarem nas estâncias hoteleiras. Nada que fosse novo. No passado já ocorreu e com maiores evidências. Na região Sul, a intolerância política dos membros da Frelimo é palpável e chega atingir níveis aterrorizantes, como os que foram assistidos em Gaza, em 2019, quando membros do Grupo de Operações Especiais (GOE), com recurso a arma de fogo, mataram Anastácio Matavel, a escassos dias das eleições e quando se encontrava a formar observadores. Enquanto nalgumas regiões do Norte, temos a Renamo a ser protagonista da intolerância.

 

Num contexto de novos actores, há uma enorme expectativa no seio dos eleitores, que veem no Chapo, a concepção de uma nova Frelimo. São eleitores que se revêem na sua simplicidade, e na projeção de um jovem de povo. Valências essas que devem ser coerentes com as suas responsabilidades na qualidade do secretário-geral da Frelimo. É de todos sabido que existem em quase todos grupos, pessoas que agem em nome próprio, e inventam ordens superiores, enquanto se trata de uma acção com motivações próprias do indivíduo que executa essas acções que mancham o grupo e a democracia. É preciso expurgá-los. O secretário-geral tem esse poder, ainda mais o candidato.

 

A Frelimo foi alertada do fenômeno Venâncio, e a resposta foi de que este só tem inserção nas capitais provinciais. São erros de compreensão por parte do “glorioso” que podem precipitar actos de intolerância política por parte daqueles militantes que estão no campo e vêem-se em desvantagem não assumida pela direcção do partido. Os alertas não visam abater o adversário, como se viu com o Golpe a CAD, mas colocar o adversário a altura de apresentar uma proposta de governação superior a este.

 

Mondlane tem a vantagem de actuar fora de um sistema que lhe ponha limites, embora menos robusta em termos de recursos financeiros, mas Daniel Chapo tem o desafio maior, assumir as rédeas; romper com a cultura de intolerância no seio do partido; a atender as expectativas das massas que vão aumentando com a projeção da sua postura simplista e inclusiva. O sistema já tem os seus inimigos criados e declarados, mas num momento em que os eleitores estão convictos de que Chapo representa o resto, comprar guerras dos outros é deixar claro que irá estar do lado do opressor. Não estamos aqui a discutir quem irá ou não governar, pelos antecedentes políticos podemos apontar a dedo, mas estamos a propor caminhos para legitimar a vitória, e tal legitimidade começa com um passo certo, uma campanha eleitoral limpa e tolerante. Deixando de lado Ossufo Momade e Lutero Simango, os dois candidatos mais aglutinadores são jovens, então, que agem como tal.

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